Pai é quem ama: laços além da ligação biológica

Pai é quem ama: laços além da ligação biológica

Conheça uma história de amor que prova que ser pai vai muito além de uma questão biológica.

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Gilberto Scofield Jr. (esq), Rodrigo Barbosa e o garoto Paulo Henrique no primeiro dia da adoção. Foto: Arquivo pessoal

Às vezes a vida nos coloca em situações que nem nós mesmos conseguimos compreender, quanto mais explicar. Quantos de nós já fomos surpreendidos com uma notícia de gravidez que nos deixou sem chão (seja de alegria ou preocupação) pelo inesperado? O Dia dos Pais é um momento interessante para que possamos refletir sobre o nosso papel no mundo e, principalmente, sobre como construímos nossas relações com os filhos.

Não podemos questionar que os laços que existem entre o pai biológico e o filho são únicos e que nem mesmo a ciência conseguirá igualar em algum momento. Mas, quem pensa que isto garante o amor entre pai e filho pode estar muito enganado também. Se fosse assim, não haveria tantas crianças abandonadas pelo mundo, sem amparo ou à espera de adoção.

Adoção no Brasil

Atualmente, no Brasil, 5.653 crianças esperam por adoção, o número que não fecha quando consideramos que existe uma fila de espera para adoção de 33.289 casais. Destes, segundo informações do Castrado Nacional de Adoção (CNA), mais da metade consideram a cor da pele indiferente, apenas 7% querem adotar somente uma criança branca e 1,77%, apenas criança negra.

Entre as crianças que esperam por adoção, 32,16% delas são brancas, 18,49% negras e 48,56% são pardas. Se a questão não é a cor da pele, qual seria então o entrave? A idade! Quase 70% dos casais preferem crianças com até 3 anos de idade, faixa etária de apenas 2,6% das crianças cadastradas, sendo que a maior parte delas tem mais de oito anos. Não há recém-nascidos esperando.

Um caso de amor

Foi pelo amor de duas pessoas que a vida do pequeno Paulo Henrique mudou no final do ano passado. Rejeitado por dois casais que alegaram que ele era “feio” ou “negro demais”, o garoto de Capelinha (MG) ganhou a chance que tantos outros no abrigo da pequena cidade do norte de Minas esperam. Foi lá que o jornalista Gilberto Scofield Jr. e seu companheiro, Rodrigo Barbosa – com quem vive há mais de 12 anos, encontraram pela primeira vez menino de quatro anos.

E é o próprio Gilberto que conta porque decidiram adotar uma criança.

“A ideia surgiu quando a gente morava em Pequim, na China, ainda em 2004. Nós ficamos muito impressionados com a quantidade de meninas que eram abandonadas pelas famílias no país e postas para adoção, internacional inclusive. Na China, não há previdência universal, então são os filhos que bancam os pais na velhice. As meninas costumam casar e constituir suas famílias e cabe aos meninos bancarem os pais. Por conta da política do filho único, as meninas costumam ser abandonadas para que os casais possam tentar ter um filho homem, um previdência futura, uma coisa horrorosa. Aquelas imagens das meninas abandonadas chamaram muito nossa atenção e daí veio a ideia: por que a gente não adota uma criança no Brasil, outro país cheio de crianças abandonadas? Fomos amadurecendo – nós mesmos e a ideia da adoção – com o tempo. Na volta ao Brasil, em 2011, decidimos enfim adotar.

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A família unida e os bichos de estimação. Foto: Arquivo pessoal

Um processo lento, mas necessário

Da decisão de adotar até a concretização do ato levou algum tempo, passando também pelo processo demorado avaliações criteriosas de perfil, com o objetivo de evitar os erros. O próprio Paulo Henrique já havia sido adotado antes, mas voltou ao abrigo após sofrer maus tratos da mãe adotiva. Por isso, Gilberto lembra que até ter a criança definitivamente em casa leva um tempo, mas que é muito importante por lidar com uma vida.

“Entender o processo em toda a sua plenitude é a maior dificuldade. Uma adoção é como uma gravidez. É preciso entender o que é ser pai, o paraíso e o inferno de ter uma criança em casa, ou seja, o processo de ser pai em si. Existe uma burocracia, mas ela é necessária. Os candidatos a adoção precisam saber que a Justiça não trabalha para eles. Trabalha para as crianças. Então os pais precisam ser investigados e analisados e participar dos chamados “grupos de apoio à adoção” antes de serem habilitados a adotar. É um processo que leva pouco mais de um ano, mas a Justiça tem que ter esse cuidado. Ainda assim, eles erram algumas vezes”, destaca.

Uma construção de laços

E não é para menos a necessidade de que as pessoas que pretendem adotar participem de grupos que as ajudem a entender como lidar com a construção de um laço afetivo, que em alguns casos pode levar algum tempo até que ele se consolide. Ao contrário do filho biológico, a criança adotada chega em um ambiente desconhecido e precisa compreender ainda qual é o lugar dela ali, lidar com um sentimento que ainda não conhece, entre outros aspectos que também podem influenciar.

Perguntado sobre como Paulo Henrique lida com o fato de ter dois pais e uma nova família, bem diferente da biológica e, principalmente, do abrigo onde passou uma parte da vida, Gilberto afirma que o garoto entende com naturalidade. “Ele lida tranquilamente. Para ele, o que interessa é a construção dos laços de afeto”.

E para quem acha que há diferenças na relação entre pais e filhos adotivos pela ausência do mesmo DNA no sangue, Gilberto ainda afirma que o amor não vê diferenças. “É o mesmo de pais biológicos, uma relação de afeto meio incondicional, meio construída, às vezes cansativa, às vezes uma montanha russa de emoções. A paternidade é um sentimento universal e independe do fato de a criança ser adotada ou não. Ou você tem ou você não tem”, concluiu.

Se você tem a intenção e adotar uma criança, mas não sabe por onde começar, no site Portal da Adoção você encontra informações importantes para compreender todo o processo.